Escrevi este cordel baseado num conto de caboclo recitado em sala de aula pelo meu ex-professor de Educação Artística, Portela, quando fazia o 1º Científico em 1980, no Farias Brito em Fortaleza-CE. Não consegui encontrar o texto original pela internet, caso o autor deste conto leia esta mensagem gentileza entrar em contato para os devidos créditos.
(Gravura ilustrativa: Levi Madeira)
CABOCLO MEDROSO
Meu sinhô mi arrepare
Eu ando mei disgostoso
Num é pru minha pobreza
Qui nunca fui invejoso
É pulo qui tenho sufrido
Pru via de eu ser medroso
Eu pensei cair no mundo
E por ai viajar
E quem sabe deste mal
De argum modo eu me curar
Butei as rôpa num saco
Às quatro da madrugada
Mi arrecumendei aos santo
E prantei os pé na istrada
Só sei qui dessa izaspada
Eu andei uns quinze dia
Mas só no rumo da venta
Sem saber pra onde ia
Até qui um dia di tarde
Parei na bêra dum rio
Num ia sintindo medo
Mas sinti uns arripio
Ai foi qui eu parei
Achei tudo assim diserto
Mi dei conta qui num tinha
Uma casa só pru perto
Pru via de num ter casa
Pra móde eu pernoitá
Vi uma árve infoiada
Imaginei me atrepá
Sei qui é dizajeitoso
Mas dá prá me agaizaiá
Subi na árve e fiquei
Ta certo qui num drumia
Mas tava bem iscondido
Pru que os gai me cubria
Se passasse argum vivente
De jeito nium me via
Mas meu sinhô quando foi
Mais ou meno às doze hora
Eu ouvi uns alarido
Cumo quem canta e quem chora
Eu arregalei os óio
E avistei uma multidão
De gente com as voz grossa
Imagiei qui era as alma
Fazendo uma procissão
Na frente avistei um pade
Cum a image do sinhô
O sacristão cum água benta
Mas ninguém trazia andô
Bateu-me um medo tão grande
Qui eu quase mi afroxava
Quando vi uns apontando
Pra dita árve onde eu tava
Quando chegaro dibaxo
Era dez pessoas ou mais
Uns preguntando aos outro
E agora o que se faz?
Uns dissero: é subir
Prá ir buscar o rapaz
Ôvindo aquelas palavra
Peguei logo a me tremer
Mermo assim imaginei
Eu num tenho o qui fazer
E respondi batendo os dente
DEIXA EU MERMO VÔ DESCER!
Meu sinhô acredite
Eu falei mei arrastado
Mas pode crê que nesta ora
Foi fei o ispatifado
Ôvindo aqueles trupiço
Pulei ligêro no chão
Sai correndo também
Mas in ôtra direção
Na frente parei pensando
Ora esssa tava ruim
Era eu cum medo deles
E eles cum medo di mim
Quando foi no ôtro dia
Qui vortei nu mermo canto
Pra vê se via o mutivo
Daquele tamanho ispanto
Por num é qui bem de longe
Vi um home dispindurado
Tinha murrido inforcado
Na dita árve onde eu tava
Nessa ora cunheci
Qual era o significado
O povo vinha buscá
O home suicidado
Quando viro eu falando
Dizendo qui ia descer
Pensando qui era o difunto
Danaro a égua a correr
Quando cheguei na cidade
Num falavo nôtro assunto
Todo mundo só falava
No discurso do difunto
Uns dizia foi verdade
O difunto falou nas guerra
Nos luxo e na vaidade
Qui se arraivara
Quem pensá qui é mintira
Pode pertuntá ao pade
Eu ainda fui na eguagi
De dizê o qui si passô
Mas fui dismoralizado
E ninguém mi acreditô
Uns cabôco inda dissero
Este cabra é mintiroso
E si meti nas história
Pra dizer qui é corajoso
Vamos dá-lhe umas isfrega
Ôvindo aquela ameaça
Lasquei o pé na carrêra
Voltei pras minha biboca
Porquê lá tô sem pirigo
Quem tiver quarquer segrêdo
Pode mi contá sem medo
Qui eu mi lasco mar nun digo!
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Levi Madeira é Médico Oftalmologista
Acesse: www.levimadeira.com.br
Site do Escritor: www.levimadeira.recantodasletras.com.br